Pergunto-me vezes sem conta
que fascínio é esse que a Igreja Católica exerce sobre tantos ‘católicos’ que
nunca perdem uma oportunidade em se mostrar distantes face ao catolicismo,
declarando-se agnósticos, ateus, ou exprimindo reservas e algum – tantas vezes
descontrolado - anti-clericalismo.
Chamo ‘católicos’ assim e com
aspas aos cidadãos do ocidente – normalmente europeus – que beberam o fundo
cultural de séculos de cristianismo e de catolicismo. O ‘católicos’ com aspas,
não é pejorativo, é sim uma constatação. Na pior, mas tão frequente, das
hipóteses, estão sempre “contra” a Igreja Católica, contra as posições da
Igreja Católica, contra os dogmas da Igreja Católica, contra aquilo que
acreditam serem os ensinamentos da Igreja Católica, contra o clero em geral e
os Papas, os Bispos, as Igrejas, os párocos, os católicos em particular. Às
vezes – na sua infinita abertura concedem algumas excepções. Aliás hoje é com
um grande à vontade que, na nossa sociedade ocidental, a que bebeu os chamados
‘valores universais’ ao catolicismo, a da igualdade, da democracia, vive-se na
total ignorância sobre o catolicismo e dizem-se com um à vontade que já não
surpreende ninguém as maiores barbaridades sobre o Catolicismo.
Não se lê a Bíblia para
começar e, especificamente em relação à Igreja Católica, não se lê nem se
consulta o catecismo, nem mesmo se leem as Encíclicas Papais, obras que são
absolutamente ignoradas pelo mainstream pensante. Assim facilmente se percebe
que a ignorância impere, mas verdade seja dita, nunca a ignorância foi
impeditiva de seja o que for - nomeadamente expressar opiniões, veicular
falsidades, e fazer filmes ou séries, escrever livros, com o Vaticano como pano
de fundo e os Papas, Cardeais, Bispos como personagens principais.
O fascínio que esse mundo
exerce é inegável e tem corpo em The Young Pope, uma série de Paolo
Sorrentino (protagonizada por Jude Law) que tem tido boa publicidade e
aceitação onde quer que tenha passado. Não sou eu que vou apontar o dedo à
série: impecável como exercício formal - até diria mais, é fascinante o cuidado
em cada detalhe, seja a fotografia, a edição, a música, o jogo de actores, a
ironia, ou os diálogos e silêncios. É mordaz na crítica subjacente e na forma
como expõe a hipocrisia e os jogos de poder que sempre existem onde quer que
seres humanos se organizem - a Igreja Católica não é diferente nisso. Jude Law
revela-se um actor melhor do que alguma vez acreditámos que fosse, e a sua
personagem tem modulações e camadas que nos prendem ao écrã. Mas no meio de
tanta perfeição formal eu sinto que falta ‘alma’ à série. Os diálogos são
inteligentes e sugestivos, mas falta humanidade, o que dá uma aspereza e uma
frieza que incomodam. Nem as séries de gangsters (li algures que Sorrentino se
inspirou nas séries True Detective e Fargo) há
tanta frieza. Há mais sangue sim, mas não tanta displicência e frieza, como
nesta série em que o Papa assume que se ama a si mais do que a Deus, e que se
ama a si mais do que ao próximo. Aliás ele diz que é demasiado cobarde para
amar o outro, e generaliza dizendo que os padres são os maiores cobardes pois
incapazes de amar o outro. Esta falta de amor ‘Caritas’ é em tudo contrária ao
que se espera do homem que lidera a Igreja Católica.
E esta é a questão que me
coloco: como é possível escrever, falar, fazer filmes ou séries sobre um Papa,
sobre o Vaticano, sobre a Igreja Católica com Deus como grande ausente? Quando
falo em Deus falo também como é óbvio do que mexe com o católico, com o
catolicismo: a Fé, a Esperança e a Caridade, (que para S. Paulo é a maior
(1Cor, 13) das três). Sem Deus, sem Fé, sem Esperança, sem Caridade, mas com
muito espetáculo, temos então e apenas um mero exercício (um bom exercício) de
voyeurismo feito por ‘outsiders’, à medida de outsiders. Mas ‘aquilo’ não é a
Igreja Católica. Há muito mais pecado e salvação, os grandes ausentes da série.
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